CEUB exibe documentário “Servidão” e promove debate com cineasta Renato Barbieri

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A obra destaca o trabalho análogo à escravidão e a invisibilidade do trabalhador rural brasileiro em situação vulnerável

Nesta quarta-feira (08), o Centro Universitário de Brasília (CEUB) foi palco da exibição do documentário “Servidão”, dirigido por Renato Barbieri. O momento, que integra a programação do Conecta CEUB, Cine Debate, fomentou discussão sobre as implicações sociais do trabalho escravo contemporâneo, com foco na Região Amazônica. Embora as condições análogas à escravidão sejam consideradas crimes previstos pelo Código Penal brasileiro, o regime persiste, sendo as injustiças sociais registradas em filme.

Com enredo que traz depoimentos sobre as falhas do sistema após a abolição, o documentário fala da realidade dos escravos libertos, que continuaram a se submeter ao trabalho escravo em troca de abrigo e subsistência familiar. “A forma contemporânea da escravidão começou em 14 de maio de 1888. O Brasil jamais experimentou um único dia como uma nação verdadeiramente livre”, aponta o cineasta Renato Barbieri. Para o autor, Servidão abre espaço para refletir um mundo cada vez mais interligado, onde questões como o trabalho escravo e a mentalidade escravagista se entrelaçam e refletem nas tragédias.

Nitish Monebhurrun, professor de Direito do CEUB e moderador do debate, observou que uma forma de invisibilidade implícita no documentário provoca o entendimento de quem se beneficia do trabalho análogo à escravidão. “Esse tipo de trabalho faz parte de uma cadeia produtiva na qual empresas e outros atores lucram, mesmo sem terem uma responsabilidade direta. Assim como o tráfico negreiro, o modus operandi persiste até hoje, embora em formas mais modernas, evidenciando uma continuidade nas cadeias de valor”, considerou.

Presente no debate, o coordenador de Arquitetura e Urbanismo do CEUB, Alberto de Faria afirmou que o documentário o fez questionar até que ponto carregamos essas condições que perpetuam formas contemporâneas de escravidão, citando casos recentes de trabalhadores mantidos em condições análogas. “Na profissão de arquiteto, vejo a invisibilidade do trabalho refletida na percepção pública sobre o papel do arquiteto na sociedade. O exemplo da Catedral de Brasília, muitas vezes atribuída exclusivamente a Oscar Niemeyer, ignora a contribuição de diversos outros profissionais envolvidos na obra”, acrescentou.

O senso comum de que a escravidão contemporânea é errada não impede que a prática aconteça, provoca a professora de Direito do Trabalho do CEUB, Moara Lima. A docente ilustra caso recente de trabalhadores rurais, em que o Tribunal Superior do Trabalho teve que reformar decisão que negava indenização por danos morais, alegando que as condições degradantes não justificavam tal compensação. “Essa falta de reconhecimento do sofrimento humano revela como o sistema judicial perpetua a invisibilidade dessas pessoas e suas lutas. Basta olhar ao redor para perceber as barreiras invisíveis que enfrentamos”.

Invisibilidade na Justiça Criminal

Especialista em Direito Penal, Antônio Suxberger observou que a invisibilidade presente no documentário também entra em sua área, especialmente na forma como o sistema de justiça criminal seleciona as ações e as pessoas que são submetidas a ele. Segundo ele, o Brasil foi condenado pela 14ª vez na Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2024 e todas essas condenações foram por falta de atuação do Estado na promoção dos direitos humanos, especialmente em casos de trabalho escravo e mortes de trabalhadores rurais. 

“O sistema de justiça criminal e o próprio Estado demonstram uma falha estrutural em lidar com essas questões, evidenciada por casos de impunidade e pela ineficiência na aplicação da lei. Mesmo emendas constitucionais visando combater o trabalho escravo enfrentam dificuldades na sua aplicação prática”, observa o professor Antônio Suxberger.

Por fim, o cineasta Renato Barbieri, conhecido por seu “cinema social de impacto”, trouxe sua expertise para fechar debate: “Esses problemas não são isolados, mas sim parte de um contexto global no qual todos estamos envolvidos. É hora não apenas de refletir, mas também de agir. Precisamos conectar os pontos que, por vezes, parecem desconexos, e tecer uma tapeçaria mais coesa e inclusiva”. Servidão está disponível nas principais plataformas de streaming.

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